A
LUTA DE CLASSES
Como
poderia um estudante de história perto dos quarenta anos de idade, no ano de
2012, vivendo num país latino em aparente desenvolvimento, insistir em abordar
tema tão controverso, passível de interpretação preconceituosa, a começar do
título, escolhido confesso, com certa relutância. Mesmo assim, tendo sido
submetido a uma das formas teóricas recorrentes da modernidade para tentar
explicar o comportamento dos homens e sua relação com os objetos, procurarei
justificar o uso da teoria de Karl Marx, somente depois, de fazer algumas
considerações sobre diversas situações, que considero lutas menores, que
antecedem a angustiante luta de classes.
Pensemos
inicialmente que este texto tem o desejo de comunicar-se com o leitor,
possibilitando novos olhares sobre as temáticas aqui apreciadas. Pois bem,
procurando não nos perder do intuito primeiro, queremos apenas ressaltar, que a
liberdade de só por algumas linhas nos desconcentrarmos do assunto proposto,
faz parte já, da dinâmica que sugere a contestação de idéias fatalistas,
dizendo em outras palavras, conceitos absolutos que não aceitam serem
relativizados.
A
que grupo, time, família, sexo, raça, religião, nação, pertencemos cada um de
nós? Por quais razões somos convencidos a fazer parte de alguns conjuntos de
comportamento, de algumas listas de procedimentos, e de muitas regras de
conduta, impulsionados por justificativas que quase sempre, anulam nossa
capacidade humana de reflexão crítica?
A
resposta à primeira pergunta cada um de nós já pode tentar responder. Agora, parte
da segunda reposta vem da estrutura cultural transmitida pelo grupo étnico do
qual participamos, essencialmente no que se refere ao conjunto de leis.
Normalmente,
em quase todas as culturas, as leis estão aí para serem cumpridas, e não se
fala mais nisso. Não existe a menor contestação de quem as criou, ou porque as
criou. Conjuntos de leis de todas as esferas e representações da sociedade dominam
o inconsciente do indivíduo à coletividade. Voltamos àquilo que chamaremos de considerações
fatalistas, e tomemos como exemplo a seguinte frase, “o desemprego é um
problema da modernidade, e, não há o que se possa fazer”. Aceitamos o
desemprego e não procuramos descobrir quais são as causas que o provocaram,
consolidando o dar de ombros que
geralmente caracteriza os grupos que pouco reclamam e quase nunca protestam.
A
outra possível parte da resposta encontra-se, justamente na agradável acomodação
que o enquadramento jurídico (real ou simbólico) proporciona a determinados
elementos de uma sociedade, provocando-lhes vaidades diversas, que serão a base
constitutiva das lutas menores, que embriagam e distraem os homens,
impedindo-os de serem sujeitos de suas histórias. Dos enquadramentos jurídicos
nacionais, que quase sempre se sobrepõem aos acordos jurídicos internacionais,
surgem outros menores, sem tanta relevância nas esferas dos estados nacionais,
contudo, estes estatutos de aparente menor expressão social, enquadram grandes
grupos sociais, criando novas cidadanias dentro da cidadania almejada para
todos, gerando em muitos uma grande satisfação por pertencerem a tais grupos, e
esta inclusão particularizada de indivíduos não-críticos, não protagonistas de
suas histórias, gera normalmente insensibilidade e falsa generosidade.
Procurando
pormenorizar qual seria o comportamento da abordagem e crítica do Direito, como
ferramenta vital para a compreensão da legalidade das ações dentro da luta de
classes, desejoso de caminhar longe da leviandade, contrapomos, o Direito Puro,
muito mais realizável nos períodos de paz, ao nosso tema conflitante.
Parece-nos
que o dever do Direito Puro, como especialidade científica, no tocante a
descrição daquilo que está em desacordo com a norma jurídica vigente, pura e
simplesmente, não possa, não deva, e principalmente, não queira invadir o campo
subjetivo daquilo que possa, deva, ou queira ser justo ou não. Em outras
palavras, o Direito debaixo desta norma, presta-se,
a dizer o que é certo e o que é errado, o justo entraria em outra esfera,
ainda mais se nos referirmos a questões voltadas à posse da terra, que acidentalmente
nos remeteria a temática principal desta conversa, objetivo que pretendemos
alcançar mais para os finalmentes.
Convergindo
para as lutas menores, os enquadramentos jurídicos constitucionais, e os
estatutos menores em geral, adentraremos nas realidades de vários grupos que
gostaríamos de pensar na companhia e participação do leitor amigo, que com
certeza se já chegou até esta parte da leitura, é porque é verdadeiramente mais
piedoso do que amigo.
Pois
então, que grupos são esses?
Comecemos
pelos mais injustiçados, em nossa opinião ao longo da história da América
Latina, os nativos, e posteriormente os negros. Trazemos para dentro dessa
discussão a posição do ser favorável ou não, à existência das cotas raciais nas
universidades pública e privada, e já, logo de cara, nos deparamos com brancos
que são contrários ao sistema de cotas, e negros que são favoráveis.
Normalmente, a parcela de brancos mais revoltosos, mesmo sem a interferência
das cotas para negros e nativos, não conseguiria alcançar as melhores
faculdades, da mesma forma que alguns raros negros, defendendo sua capacidade
de galgar os mesmos postos sociais que os brancos por que possuem as mesmas
potencialidades intelectuais, e possuem mesmo, possivelmente e normalmente
abandonam a luta a favor das cotas, por já estar inseridos em outros grupos que
lhes dão a sensação de maior aceitação social, ou por que têm garantidas
práticas de consumo próprias da classe média para cima, ou porque cansados do
racismo silencioso que os incomoda desde a infância, preferem fingir que ele
não existe mais. Escolhemos naturalmente falar mais dos negros do que dos
nativos, em razão da quantidade de negros no caso brasileiro constituírem
metade da população, o que não nos deixa menos felizes em dizer que as
populações indígenas nas Américas pararam de diminuir, pelo contrário, voltaram
a crescer, frustrando com certeza a expectativa de alguns. Fazendo a ligação do
enquadramento jurídico com as cotas nas universidades, temos brancos sendo
excluídos de grupos que pensavam fazer parte mais não faziam, e temos negros
negando a inclusão por vaidades irreais, ou seja, o racismo ainda continuará
mesmo que seja sabido de todos que o negro não é inferior ao branco em nenhum
aspecto, contudo, o enquadramento jurídico das cotas é real e legítimo, e tratará
com a mesma frieza do Direito Puro a vaidade do complexo de inferioridade do
negro, sentimento este, que precisa ser abandonado com a aceitação das cotas
até a igualdade total das oportunidades. A condição de inferioridade produzida por
injustiças históricas será corrigida por força das novas leis, que melhorarão
mediante o aumento da consciência de classe dos cidadãos.
Dando
sequência a este diálogo pensado, referimo-nos, aos religiosos em geral, como
grupos predominantemente ligados a estatutos menores, que são responsáveis pelo
enquadramento de grandes parcelas da sociedade que se sujeitam a verdades
relativas, que quase sempre tem a finalidade de opor grupos comportamentais,
regionais, culturais e absurdamente raciais, deixando à margem, a missão histórica
das religiões que é a prática não discursiva da caridade.
Não
deixemos de fora os economistas, que de forma muito parecida com a dos
religiosos, ainda mantém como postulados incontestes, afirmativas como esta de
Adam Smith do século XVIII, “é a grande
multiplicação das produções de todos os diversos ofícios - multiplicação essa decorrente da
divisão do trabalho -
que gera, em uma sociedade bem dirigida, aquela riqueza universal que se
estende até as camadas mais baixas do povo”. Quanta
ingenuidade! Mas em 1750 e poucos, ainda
vá lá! Das camadas mais baixas do povo
destacamos como grupo principal na luta encarniçada pelo estabelecimento do
respeito igualitário, as mulheres, que por muito tempo em suas mentes se
permitiram pensar que teria sido melhor se tivessem nascido homens, tamanha a
desproporção dos direitos masculinos sobre os femininos. Pois bem, dentro do
entendimento que essas situações de conflito até aqui mencionadas são as
maiores depois da propriamente dita luta de classes, e que cada uma delas, em
níveis diferentes, é estimulada por vaidades individuais e coletivas, partamos
na direção das nossas contestáveis conclusões, onde poderíamos citar a
arrogância vaidosa de outros grupos de menor relevância, tais como os enólogos,
os músicos, os lutadores, os heterossexuais convictos, os homossexuais por
conveniência, letrados em geral, magros, a lista é imensa...
Nem
todos os relacionados são necessariamente arrogantes e/ou vaidosos, contudo,
acreditamos que o orgulho criado dentro de ideologias de grupo,
inadvertidamente, pode produzir desuniões desnecessárias, criando hostilidades
imbecís, desconcentrando a união que traria a força para transformar o que
realmente está errado, a distribuição da riqueza que é produzida pela grande
massa trabalhadora, que fica assistindo debilmente a discussão da tonalidade da
cor da roupa do mascote da copa do mundo, enquanto tem gente com dor, e tem
gente com fome, tem gente com lágrimas. Puxa vida, que conversa chata.
Por
esta razão Marx é odiado, porque ele toca na ferida dos homens egoístas que
arrotam religiosidade.
A
desesperança criada num mundo desigual e insensível consegue achar absurdo, uma
mãe dando uma criança recém-nascida ou abandonando-a, mais é incapaz de
observar o flagelo humano desta mãe abandonada pelas políticas públicas
inexistentes, havendo leis existentes. Como falar em desumanidade dentro do conforto
de nossas salas refrigeradas e confortáveis. Absolutamente não há problema
algum em gozar de toda a tecnologia possível, mais por quanto? E até quando?
Existe uma luta silenciosa pelo uso-fruto do consumo constante, e o papel dos
soldados calados, mudos não, quase sempre é alienado.
Daí,
a contribuição da teoria de Marx, que se utilizou dos estudos de Adam Smith,
Rousseau e Feuerbach. Muito além das definições da mais-valia, exército de
reserva e fetichismo das mercadorias, a grande sacada de Marx, foi deixar o
entendimento de como funcionaria a economia do mundo moderno, utilizando como
ferramenta a História, a Economia e a ruptura do Direito que protege a
propriedade privada e improdutiva. Se apossando de tal conhecimento qualquer
cidadão poderá encontrar sua própria consciência de classe, e fazer uso dela em
todos os seus recursos.
Semelhantemente
é o estudante que conhece o pacote Office da Microsoft, que vai acompanhá-lo em
toda sua vida escolar e profissional, de maneira que sua vida ficará viável e
confortável, em razão dos benefícios infindáveis deste facilitador da
modernidade.
Quem
não usa essa tecnologia nos dias atuais?
Cidadãos
honestos e criminosos se rendem a Bill Gates com programas originais ou
pirateados.
No
grande clássico da historiografia moderna “A Era dos Extremos”, Eric Hobsbawm
pontua sobre existência e atividade de muçulmanos marxistas e cristãos
marxistas.
Concluímos
se quisermos que;
Todos
que desejarem, podem ser marxistas, todos, todos.
Alexandre
Cabral de Rezende
*Mas é incapaz de observar o flagelo humano....
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